Elzana Mattos

Gotas Acesas -  que jorram infinitamente...do meu ser!

Textos


                                            
               O Quarto Cor de Rosa...

     Todo manhã acordava soltinha, soltinha ao vento. Arrumava os seus cabelos com uma fita rosa de cetim e colocava um vestido de organza bem claro, rosa bebê. Calçava um sapatinho rosa, todo bordado de pedrinhas e vidrilhos. Combinava tudo isso delicadamente, com um toque de seu perfume de rosas preferido, olhava-se num espelho grande, afixado por detrás da penteadeira. Onde podia-se ver toda a silhueta do seu corpo cheinho e esbelto. Curvas discretas e um tom rosado nas faces de gueixa. Tudo discretamente bem bordado num ser de menina saltitante de ideias e sonhos carbonados.

     O tempo no seu quarto,  tamborilava frenético, porém, suas saias ao vento assaz se movimentavam desalinhadamente... os seios enrubesciam e a boca ficava seca; toda manhã era um ritual quase que sagrado. Tinha pudores que exalavam através da sua pele porcelana. Ah, um cheiro de amor penetrava pelas frestas da janela aberta do seu ser - entediado! Haveria lá fora mais vida - do que aqui - dentro dela (redarguia) pensativa e quase incerta!.

     Saiu do quarto. E debruçada na varanda acesa dos seus saberes, ficou pensativa, quase mal humorada, pois ainda não havia tomado o seu primeiro café do dia, (xícaras e xícaras incontáveis), cada gole... descia mornamente, pela sua garganta seca de dizeres -estranhamente preferia café, em vez de chá de rosas-; sorvia-o demoradamente, antes mesmo, que a sua língua se queimasse.
     Adiante, podia bem se ver do outro lado: uma senhora de aparência austera, magra de doer, com um semblante intranquilo, postura encurvada, debruçada no peitoril que dava acesso a rua pacata  de uma cidadezinha do interior. Aquela mulher era sua mãe e quase sempre se mostrava estática, diuturnamente, sempre com os olhos semicerrados, olhando através das suas lentes grossas e  baças da vertiginosa  fumaça engordurada  que saía da sua cozinha ampla, impregnada por manchas e manchas fantasmagóricas nas paredes fumarentas. Era uma cena pitoresca, porém, percebia-se, que na face encarquilhada dela havia um leve torpor desembaraçante, desconcertante...de se ver. Havia muito mais além do que a real aparência do sensório; sua respiração sempre ofegante e cansada - oscilava no tete-a-tete - do sussurrar dos que ficavam sempre à espreita, apenas para marcar a sua presença pressurosa;  talvez incomodativa, dos pensamentos que se alinhavam em seu colo ainda quentinho quentinho...de mãe... ao se derramar átimos... do pó da terra, que  também,
tamborilavam...desavisadores!
     De sua janela, quis por algum tempo ouvir na voz dos ventos os ecos das lembranças... - nós duas juntinhas na varanda ensolarada...(nos disse me disse a desatar os nós). Ah! bons tempos... eram aqueles... velhos e inesquecíveis... tempos...
armazenados e adormecidos pela crueza intempestiva e desazada dos dias des (vividos)!
     Porém, o dia já se portava bem alto e o sol caliente... penetrava audacioso, através das cortinas entreabertas, como se quisessem possuí-las. Mas, aqueles fragmentos foram repousando um a um - mornamente na caixa preta da memória-. Então, em vão ela foi saindo, afastando-se  e em seguida, foi tomar café na cozinha. Ficou por ali algum tempo...e o aroma bom do  café da fazenda...passou a trazer-lhe inúmeras reminiscências aconchegadas...
Lembranças quedaram; e já não mais existiam tão totalizadoras do outro lado da sala dos seus haveres - ao perceber distâncias e desencontros.
     O tempo passava e passava... e, o seu quarto todo rosa - calmamente... sempre a esperava. Mesmo silente (onipresente) sem dizer nada. Outrora alegre e vivaz - ora soturno e quase sombrio de cortinas sempre cerradas. E, o sol já não mais brilhava. Ela era toda feita de sol e estrelas matutinas, mesmo pequerruchas, miudinha, ela sempre trazia muita alegria a casa. Mas com o passar das auroras...tudo foi ficando mais cálido e silencioso...ela já não mais reluzia...apenas se ia...ou vinha...
     Saía e saía...nas noites pranteadas e retornava sempre quieta, estrábica, usando uma máscara, de folhagens e pétalas enegrecidas, ao passo que ficava mais complexa e ausente do que o dia de ontem! De repente a clepsidra da hora se avolumava e ela, agora incógnita,  começava  a sentir um friozinho na barriga ( uma rapariga não pode ter essas sensações)! Escamoteou tantas coisas e coisinhas, no seu dia-a-dia que perdera a conta (e o relógio, britanicamente... ressoava acordando os seus pensamentos)
     Desfiou uma cordilheira de ansiedades no rosário da hora que entrecortava, e seguia desafortunadamente, sozinha. O seu quarto enrubescido pelas paredes rosentas e desvividas - não saberia onde guardar os seus melhores anos e segredos? Juventude e meninice faziam parte intrínseca dela - queria um tom a mais do que o rosa púrpuro que se dissipava das paredes imóveis do seu quarto - incontido e perpendicularmente bem dividido -  sempre recorria a essa sensação de ingenuidade e tontice - era para que o tempo se concretizasse mesmo inóspito e por vezes insosso no  desacordar.
     E o chão se abriu! e ela desvanecendo, cambaleante, fragilíssima, ao deixar sua bonequinha dormindo! então, se aproximou mais e mais perto do seu leito, ainda quentinho; de repente um jorro de vida começava a se expirar de dentro para fora com tamanho ímpeto, que começava a transpirar, faltava-lhe ar; estava encharcada de suores e um líquido esquálido e viscoso...desciam por entre, as pernas(era um líquido aquoso e vermelheço - não róseo).
Por alguns segundo deu voltas e voltas no seu quarteirão de sonhos... tudo em vão! Surpresa e dor incontida! no abajur rosa que também se se apagava...e a vida
escorria lentamente da sua fortaleza maléfica - prosaica - longe de tudo e longe do mundo. Mais uma vez estava ela -  debruçada na borda da cama - somente só, numa dor lancinante, ao ver a vida escorrer...tropegamente...interrompida( a verter lágrimas da cor de sangue), e o seu quarto que era todo rosa - não o era mais! por algumas átimos de segundo...intermináveis segundos, que se bifurcavam nas cores inexatas do agora tão cruel e ríspido que aos jorros molhavam todo aquele lençol branquinho branquinho bordado com pequeninas rosas - ao ficar quase róseo de tudo! e o rosa bebê se tornara róseo-amargo sem pedir licença aos seus bordados (ora, se tornarem fel e tranças em forma de mordaças).
O quarto que era rosa...ficou róseo-púrpuro sem falar ou pensar em mais nada. E, o dia desamanheceu naquela antemanhã também rosa que se predestinou.
     E, o Eu, o seu quarto, e um quarto de Si, também rosa, de des(sonhos), permaneceram inflados...dentro da casta...ao  manter uma leve e doce inocência quase transparente...tatuada... na camisola finíssima, ao ser atravessada e devassada pelos raios luminosos, que sempre a visitaram-na mesmo na calada da noite, na alcova da vida, que pulsava também, lancinante, por vezes, cor de rosa.
     E, o dia desamanhecido renascia novamente - no quarto rosa - que por alguns instantes, rodopiava... ao sabor dos prazeres ( ao esconder uma maldadezita embrenhada de desconfiança), por vezes,  estupidamente atrevida, bem escondida, ao sempre adormecer bem rosada! foste o que fosse sempre despertava - envergonhada e imexida das coisas reais, (no quarto rosa da rosa), que guardava infindos segredos - desbotados e desprovidos de outras tranças! rosa no rosa da Rosa - desabrochando-se, descolorindo-se, inexoravelmente, todos os meses! 
 
 

 
 

 

 
 










 
Elzana Mattos
Enviado por Elzana Mattos em 08/10/2013
Alterado em 11/10/2013
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